4 de jun. de 2008

Mentira

Eu tô na merda. Não, cara, você não tá entendendo. Eu tô na merda mesmo. Não mudei de país ou fui despejado de casa. Ainda. Mas tô um lixo. Entrei num complexo comportamental que, como já disse, é complexo demais. E o problema maior é esse mesmo: de tão complexo, nem eu entendo. Então como alguém entra em algo sobre si próprio que nem ele mesmo entende? Complicado. Mas voltando.

Eu perdi meu o controle das coisas. E olha que nem me drogo. Mas saiu tudo das minhas mãos. Antes eu gostava muito de enfeitar os trabalhos escolares. Fazia de tudo mesmo pra eles ficarem lindos, no duro. Hoje, eu não consigo nem se quer começar a fazê-los. Logo, dá para perceber que na faculdade as coisas andam bem, obrigado, mas empurradas. E daí vem o emprego que, bom, na verdade vem a minha segunda casa. Estranho. Eu acho que deveria ter uma cama por aqui, porque daí já dormia e acordava direto, no outro dia. Ia me poupar toda essa vida de vai-volta nos ônibus. E, sabe, né, o transposte público de São Paulo não anda lá essas coisas. Aliás, o transporte todo de São Paulo não anda lá essas coisas. Na verdade, não anda nada. Literalmente. Enfim. São seis horas de ônibus, metrô e trem por dia. Depois, oito horas de trabalho. Mais cinco horas de faculdade. Me sobram seis. Seis horas, das vinte e quatro que existem. O que eu faço nelas? Durmo. Ou me entrego para alguém. Ou faço trabalho da faculdade. Ou falo no telefone. Talvez isso explique a última conta: seiscentos e vinte e dois reais. Resolvi por em extenso aqui. Eu sei bem o que os números podem causar de primeira impressão.

Pra piorar ainda mais as coisas, me assumi um compulsivo. Consumista. Se vejo uma roupa, penso em mil razões para não comprá-la. Mas em um milhão para tê-la. É incrível como meu cérebro funciona. Já liguei pro gerente do banco umas dez vezes para pedir um aumento do cheque especial, só pra eu poder comprar aquele cardigan listrado que vi na Zara ontem no almoço. Ele recusou, é claro. Sabe que minha situação financeira não é lá uma das mais estáveis. Pelo contrário. Mas deve ter alguém pior que eu nesse quesito, não? Uma amiga, por exemplo, deve mil e quinhentos reais no cartão de crédito. Pode? Muitas coisas a prazo, né? Então, eu devo setecentos. Em um, no Visa. No Mastercard, uns oitocentos. No outro Visa, uns mil. Sem exageros. Droga, passei ela. O salário é daqueles que ninguém vê, cai na conta e cobre o limite. Daí caí algum débito automático que eu havia esquecido e pronto. Não tenho dinheiro nem para comer, porque o vale-refeição da empresa eu vendo pra poder sair. Mas isso é supérfluo, sei que no final do ano, com o décimo terceiro, devo pagar tudo. Até lá eu dou um jeito. Brasileiro.

E o resto? Bom, no duro, é complexo o bastante para eu nem saber como escrever. Já lotei a caixa de e-mail de uma pessoa de mensagens. A frase que fica foi a que uma amiga me disse nesse instante “sempre que você faz algo na surdina, por melhor que seja a intenção, todo mundo vai ver errado. Diferente de como você pensa. Somos todos diferentes. Eu acharia terrível o que você fez. Mas eu sei que você não fez de propósito. Errado é você de não ter auto-confiança, de ser bobão e aceitar tudo”. De fato, sou. Mas agora já aconteceu tudo, virou uma grande bola de neve. E o ruim é não ver soluções. Sou cheio disso, sabe, de tentar ver resoluções. Mas são todas superficiais. Igual a mim. Acho que tenho que aprender a ver o meu íntimo, me entender melhor. Se não sei o que quero, é natural que os outros duvidem da minha veracidade.

E quando a gente tá na merda, assim, dessa forma, nesse lixo todo, é claro que queremos desabafar. Daí eu pego a lista de contatos do celular e vejo que de lá, só tem um número confiável. Mas ele começa com 971 e me lembro que, apesar de ser o mais discado, hoje eu não posso contar com a voz do outro lado da linha. Talvez nunca contei, de verdade, por isso que nesse exato momento ela não iria me atender. Com vontade, pelo menos. Então eu blogo. Eu volto às origens, aos quinze anos de idade, e blogo. Posto, como se esse espaço fosse um pequeno diário, o grande desabafo. Ninguém ouviria essas lamúrias com tanto empenho para me entender. Mas elas não devem passar em branco. Se eu as esconder, elas se tornam história. E, nesta altura de vida, nos meus 20 anos – plenos 20, sou jovem, né? – tudo o que não quero é ter histórias. Apesar de inevitáveis, algumas são tão surreais que se apagam e são lembradas quando não são mais bem vindas.

Então que fique aqui, escrita. Se um dia eu morrer e alguém quiser escrever uma biografia minha – talvez eu me torne uma celebridade depois de morto, esse lance de morrer e ser considerado alguém me intriga um pouco – vai ter essas palavras para começar a obra. A internet nunca deve morrer, mesmo, só se aprimorar. Ao contrário do ser humano, que só regride no tempo.

E mesmo com tanta auto-afirmação, percebo que, além de mentir pros outros, eu menti para mim mesmo.

Um comentário:

Maria Loverra disse...

Daí eu pego a lista de contatos do celular e vejo que de lá, só tem um número confiável. Mas ele começa com 971 e me lembro que, apesar de ser o mais discado, hoje eu não posso contar com a voz do outro lado da linha.

e o 9476, não significa nada pra você? tá aí, um texto seu, que não consigo ver nenhuma mentira.